quinta-feira, 22 de outubro de 2009

- Ouvir o som do teclado.

Ela ia escrever algo sobre Patagônia, Madagascar,Artesanato e Malabares, Argentina, Santa Catarina e a vida livre de sutiãs.
Ia dizer quão grande é o sentimento que pulsa, explode, transcende dentro dela.
Ia falar dos planos da adolescencia e como todos eles foram se perdendo num tempo humanamente cruel. De como o mundo arrancou os sonhos fantásticos, lunáticos, cheios de uma fantasia frenética, e substituiu-os por sonhos racionais, sem brilho, sem asas quebradas. Sonhos baseados em quanto tempo e dinheiro ela precisa gastar por eles. De que amor ela vai ter que abrir mão, para praticar o amor próprio. De quanto trabalho ela vai ter que levar para casa.
Ela ia dizer sobre os bons 15 anos, das amigas inconsequentes, das bebidas adocicadas pela ideologia de liberdade.
Ela ia contar sobre seu primeiro trago, como a fumaça lavou sua alma.
Ia falar sobre como a Nostalgia a retira dos dias difíceis, os dias em que as lembranças partem seu corpo e consciência, dos dias em que a dor lhe causava melodias violadas.
Ia contar de como o pré-morte é divertido e assustador, de como o pós-morte é tal qual a vida.
Ia falar dos amores, amores que nunca amou.
Ia falar dos dias de hoje, os quais ela repete a mesma sequência, a sequência de erros, a sequência de acertos, a sequência passos, a sequência ônibus, a sequência de olhares, a sequencia de fotografias imaginárias.
Ia falar sobre escrever. Ia dizer justamente, que quanto maior for a produção de ideias transcritas, maior é a tristeza, a tristeza é inspiradora, é a fonte.
Ia dizer como Jack kerouac e Richard abriram seus olhos para algumas coisas.
Ia dizer sobre o amor em sua forma física, o amor em seu estado real. Ia falar sobre a ilusão, sobre como ela destrói um estômago.
Ia falar de seios e maquiagem, sobre como eles conseguem fazer com que as ideias femininas sejam aceitas com louvor, como eles manipulam coisas "imanipuláveis", pra ela é um mistério.
Ia falar sobre a vida, e as coisa inúteis, e até fúteis que ela abriga.
Ia falar de justificativas, sobre como elas são dispensáveis depois de um erro.
Ia falar da vida, sobre as coisas que acontecem na sua, dos detalhes que compõem sua amadora vontade de ser.
Mas daí ela pensou: Pra quê?

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

- Nêga.

Ele achou uma nêga.
Uma nêga para passar a vida inteira.
"Que lhe maltrata, machuca e lhe fundi a cuca".
Mas apesar das dores repentinas ele sonha lhe dar um vestido branco e firmar compromisso.
Uma nêga de pele branca, olhos escuros e sentimentos claros.
Uma nêga diferente no jeito de ser e na maneira de pensar.
Uma nêga não Amélia, uma nêga feminista, feminina.
Uma nêga que se parece com ele de formas totalmente diferentes.
A amiga e a amante.
A admiração fisica e psicológica.
A vontade de estar, bem estar.
"Que nêga é essa?"

(Henrique Almeida)

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

- Toques.

Primeiro toque: ela pensa em atender, mas considera a possibilidade de ouvir o que não quer.
Segundo toque: ela finge ignorar, sem pensamento algum de consequência.
Terceiro toque: ela repensa atender, mas considera a possibilidade de dizer o que não quer.
Quarto toque: ela desiste de atender.
Quinto toque: ela desiste de desistir.
Sexto toque: ela sai correndo em direção ao toque, pulsante, ofegante, cheia de um desejo imenso de ouvir e dizer o que quer e o que não quer...
mas ele pára, e há silêncio.

sábado, 3 de outubro de 2009

- Um pote. (6570º dia)

À partir de hoje, ela pode beber.
À partir de hoje, ela pode fumar.
À partir de hoje, ela pode ir pra um Motel.
À partir de hoje, ela pode ser presa.
À partir de hoje, ela pode ser julgada por seus erros.
À partir de hoje, ela pode ela pode dançar em boates.
À partir de hoje, ela pode dirigir.
À partir de hoje, ela pode prestar concursos públicos.
À partir de hoje, ela pode se casar.
À partir de hoje, ela pode ser eleita.
À partir de hoje, ela pode eleger.
À partir de hoje, ela é obrigada. A fazer, só fazer.
À partir de hoje, ela pode assistir filmes adultos.
À partir de hoje, ela pode ir sozinha ao médico.
À partir de hoje, ela pode ir à excursões de escola sem autorização.
À partir de hoje, ela pode comprar bebidas no supermercado.
À partir de hoje, ela pode fazer tudo que já fazia antes, mas com o peso de estar direito. Certo, contido.
À partir de hoje, ela pode olhar com nostalgia sua infancia, e com arrependimento sua adolescência, que deixou tantas coisas mal feitas, tantos erros incorrigíveis, tantos machucados "incicatrizáveis", tantos caminhos certos para trás.
À partir de hoje, as lembranças podem se tornar distantes.
À partir de hoje, o futuro chegará mais rápido, mais amedrontado, mais tímido.
À partir de hoje, ela pode olhar seu quarto e desejar não ficar muito tempo nele.
À partir de hoje, os sonhos não podem mais ser financiados, apenas pagos à vista.
À partir de hoje, as noites serão mais curtas, e os dias mais cansativos.
À partir de hoje, tudo que acontecer na vida dela, será repetido, apenas com novos nomes.
À partir de hoje, o que ela pode esperar, é um bom dia, boa noite, obrigada.
À partir de hoje, ela é obrigada a fazer do dinheiro uma rotina.
À partir de hoje, não vai haver possibilidade de novos melhores amigos.
À partir de hoje, ela pode esperar o amanhã com a certeza de que ele tem nome.
Mas à "partir de hoje", ela não queria ter de fazer essas coisas, esses maus e bons direitos e deveres. Hoje ela não queria nada disso, ela não deseja nada dessas coisas as quais ela já carrega consigo antes do "à partir de hoje".
Hoje e "à partir de hoje", ela só queria ter sorrisos sinceros e livres...e um pote de sorvete.