terça-feira, 8 de julho de 2008

- Après-mort (pequenas doses de ficção)

O doce veneno escorre por entre seus lábios, matando-a, crucificando seus desejos mais profundos, lapidando com armas de anjo seus sentimentos sórdidos e solitários.
Da janela, penetra um raio de luz, clareando sutilmente o quarto escuro, cheio de angústia. A fresta brilhante invadiu os detalhes: as fotos amareladas em portas-retratos antigos; os comprimidos espalhados pela escrivaninha, coloridos, cheios de sensações contidos em tão pouco espaço; a garrafa vazia de alguma-coisa (etiqueta arrancada com suas unhas mal feitas); o espelho que refletia uma parede descascada, suja de resquícios de sangue, talvez gorfo (fruto dos excessos das noites passadas) e a pequena poltrona, cujo a espuma se vê para fora. Apesar de a luz ter invadido o quarto, ela recusava a idéia de levantar, não queria ver o mundo, não queria ver nada. Nada.
Sua cabeça girava, seus olhos se fechavam sozinhos, sua boca (ainda molhada com doce veneno), demonstrava-se seca, sua garganta arranhava, como se tivessem gatos subindo pelas paredes internas de seu corpo. A sensação a prendia na cama, matando qualquer desejo que pudesse interromper aquele momento de reflexão, aquele momento pós-porre, pós-drogas, pós-sexo - Pós- morte. São mais de 48 horas sem dormir, e mesmo assim ela queria mais, queria mais alguma coisa, que não sabia.
Estava enojada com aquilo tudo, aquele quarto mau-cheiroso, aqueles lençóis sujos, travisseiros manchados, paredes estranhas, espelho quebrado....Mas resistia. Estava cansada da mesma cena das semanas anteriores, seu corpo não agüenta tanta dor e desprezo, seu corpo não consegue mais lutar contra o que sua alma pede, seu corpo a ignora, como um adolescente ignora seus pais, seu corpo não quer deixar seu "eu" descansar...isso a mata, a mata a cada dia...
A luz se recolheu para sua origem, e o quarto tornou-se escuro novamente. Jogada naquela cama insípida, ela pensou na última palavra que pronunciara, refletiu se era isso mesmo que queria, se seu corpo seria a última fortaleza existente ou se transformaria na agulha que fica no palheiro; sem pensar novamente, ela se arrastou até a escrivaninha, pegou os comprimidos, acendeu um cigarro amassado, sabia que era assim, e embarcou naquele mundo fantástico das percepções fictícias...só assim ela esqueceu a realidade.

3 comentários:

Iuri Gabriel disse...

Quanta densidade Maitê. :X

Muito bom. Porém denso, fica suspeito.
Beijos na testa, e muito chocolate!

Iuri Gabriel disse...

Quero conversar com a senhorita.
Me diga um horário que entra, e tentamos nos achar!

Beijo na testa

( Anatomia romântica, agro-sentimental, melhor parar com esses trocadilhos ahahahaha )

Unknown disse...

Eita tinorrsss!!!


bju